quinta-feira, 7 de janeiro de 2021

Ler o que faz bem para a alma?

 


Liberdade de escolha: quem garante?Cristina Maria Rosa

 

Dialogando com meus alunos leitores da UNAPI – Universidade Aberta a Pessoas Idosas da UFPel, neste dia do leitor, travamos um interessante diálogo a respeito do que são “as melhores” leituras, livros autores, e quem teria o saber/poder de decisão/orientação.

Cientes de que há agentes – pais, professores, escritores, leitores, pesquisadores, sábios – a indicar e conduzir os demais e que “não basta ler qualquer coisa”, concordamos que a qualidade da leitura que fazemos “depende de quem nos orienta”. Entre nós circulou, também, a ideia de que “as escolhas dos orientadores deveriam ser baseadas na qualidade e não na origem do escritor”, pois há obras estrangeiros que são descartadas apenas por não terem sido escritas na língua pátria.

Na maioria das vezes o que ocorre? Pergunta uma de minhas interlocutoras. E ela mesmo responde, já argumentando: “Os jovens detestam o que têm obrigação de ler!”

Querendo saber se os professores são orientados quanto a isso, a pergunta tocou para mim. Não me furtei.

Os professores...

Não conheço a orientação que é dada aos futuros professores nas Licenciaturas em Letras. Mas sei que, nas instituições em que se estuda Literatura Brasileira, se ensina o que é considerado clássico brasileiro. Machado de Assis em diante...

Nas minhas aulas na Licenciatura em Pedagogia, como a literatura escrita para crianças tem origem em culturas europeias, o clássico vem "de fora", exigindo que tenhamos mais amplitude ao tratar o que é o cânone. Consequentemente, menos preconceito em reconhecer que literatura, desde que de qualidade, não importa a origem...

Eu pergunto: no Brasil, temos bons escritores? Quem pode responder? Quem leu tudo o que foi produzido no mundo e pode atestar que a nossa literatura é boa?

É por isso, por não conseguir, em uma vida, ler tudo o que já foi escrito que nós, reles mortais, precisamos de ajuda. E o que é ajuda? Ajuda são obras escritas por renomados leitores que indicam...

Exemplo: Uma rede de casas encantadas, de Ana Maria Machado, a reunião de melhores contos, poemas, fábulas de um país como Os 100 melhores contos de humor da literatura universal, organizado por Flávio Moreira da Costa, o livro Por que ler os clássicos, de Italo Calvino, Contos e Poemas para crianças extremamente inteligentes de todas as idades, de Harold Bloom, Como e por que ler os clássicos universais desde cedo, de Ana Maria Machado, entre outros.

O que é o melhor e para quem?

Essa pergunta, vinda de outro de meus interlocutores, põe em xeque o cânone ou o que especialistas indicam como cânone. Afinal, quem tem a prerrogativa de decidir o que realmente devo ler?

Ao pensar em responder, lembrei-me de uma reportagem que li a respeito dos livros indicados ao vestibular. Nela, um “especialista” dizia que bom mesmo é aquilo que gosto. Pensei um pouco mais e recordei de filósofo brasileiro, vivo, que diz que nosso tempo é curto, então, não devemos perder tempo lendo o que não é bom. Eu gosto dessa ideia: ler só o que é bom. Mas como saber, antes de abrir um livro?

Na Universidade, um de meus trabalhos mais intensos é na formação de novos leitores. Então, o gostar de ler, às vezes, se sobrepõe ao "o que ler". Quando o diálogo é com leitores maduros, "o papo" é outro e podemos explorar mais os critérios do que é considerado bom...

O que observo, mesmo entre pares, é que a maioria não sabe o que é "formar um leitor". Isso não é um demérito. Mas deve ser um desafio.

Alfabetizar literariamente é parte de um processo delicado, e poucos, realmente, conseguem ter êxito quando se propõem.

Fim de papo...

Ao fim de nosso diálogo, um de meus interlocurtores, escreveu:


Penso que a literatura tem suas nuances para cada pessoa. No meu caso, nunca tive vontade de ler Biografias, mas ganhei a do Getúlio Vargas e gostei. Fui buscar em livros guardados e encontrei a sequência com outro autor e estou lendo. Devemos estar abertos para todas as possibilidades e leituras que deem satisfação, independente da critica ou opinião de A ou B. Penso que os jovens não podem se tornar leitores só quando vão fazer vestibular, tem que começar muito antes...

 

 

Esse tempo, o “antes de ser adulto”, é realmente importante na formação de leitores. Alguns pensam que “as pessoas têm que ler o que faz bem para as suas almas” e que “deveria ser um direito constitucional” o acesso ao prazer da leitura.

Mas, como considerou um de nós, para encerrar o papo: “Quando tu estás estudando para o vestibular, nem alma tu tens!”.

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