terça-feira, 3 de setembro de 2019

Livros para bebês: criança pequena não pode ser subestimada!


Livros para bebês: criança pequena não pode ser subestimada!
Cristina Maria Rosa

A categorização das obras que deram início ao acervo da SLEV – Sala de Leitura Erico Verisisso – foi inspirada nos critérios desenvolvidos por Fanny Abramovich (1989), Nelly Novaes Coelho (1993) e Maria Betty Coelho Silva (1991). Para as autoras, a criança que se encontra na primeira infância (entre zero e seis anos) é o potencial leitor, pré-leitor ou leitor pré-escolar.
Para Abramovich (1989), a literatura tem linguagem fluida e aborda os problemas de modo discursivo. Assim, os critérios a serem adotados quando da escolha de obras são:
a) ter como princípio que a formação do leitor inicia pela audição de muitas histórias;
b) escolher inicialmente histórias curtas e bem humoradas, inteligentes, criativas, que surpreendem e investir na escolha – intransferível e pessoal – de obras a serem lidas pelos leitores;
c) observar de forma crítica como os personagens são representados nas ilustrações, especialmente os pobres, as mulheres, os indígenas, japoneses e negros, as mães, tias e professoras;
d) priorizar a presença de humor, o deboche saudável, a ironia, o nonsense, a presença de personagens nada comuns;
e) preferir obras com presença da lógica da criança;
f) inserir a poesia “boa, bem escrita, que mexe com a emoção, que nos aguça, que nos deixa um pouco diferente depois de cada verso”;
g) propor obras que oferecem informação e verdade, pois “entender o processo de como nascemos até quando morremos faz parte natural da curiosidade da criança”;
h) ler integralmente os “Contos de Fadas” pela abordagem do amor em todos os seus prismas: descoberta, encanto, possibilidade, entrega, plenitude, sofrimento, angústia, injustiça, tristeza, obstáculos, dúvidas, identidade, rejeição, perdas, esquecimentos, revelações de sexualidade, da vida e da morte.
Para Nelly Novaes Coelho (1993) a categoria leitora está vinculada a três fatores: “idade cronológica, nível de amadurecimento biopsíquico-afetivo-intelectual e grau ou nível de conhecimento/domínio do mecanismo da leitura”. Assim, indica compor um acervo a partir da seguinte divisão: 1) pré-leitor (primeira infância que inclui bebês dos 15/17 meses aos 3 anos e segunda infância, com crianças a partir dos 2/3 anos); 2) Leitor iniciante ou crianças a partir dos 6/7 anos; 3) Leitor em processo ou crianças a partir dos 8/9 anos; 4) leitor fluente ou criança a partir dos 10/11 anos e 5) leitor crítico, já um pré-adolescente a partir dos 12/13 anos.
Para Maria Betty Coelho Silva (1991), devem ser respeitadas as peculiaridades e os estágios emocionais das crianças na escolha dos livros. “Alimento da imaginação”, as histórias precisam respeitar a “estrutura cerebral” infantil. A autora faz um quadro demonstrativo de interesses, no qual divide os leitores em pré-escolares e escolares. E divide os pré-escolares em duas fases: a pré-mágica (crianças até três anos) e a mágica (crianças de três a seis anos). Aconselha para os primeiros, histórias de bichinhos, brinquedos, objetos, seres da natureza (humanizados), história de crianças. Para os demais, histórias de repetição e acumulativas, além de histórias de fadas.
Os bebês e a leitura
Pouco estudados no século XX, esse grupo de leitores em formação (bebês em sua maioria não escolarizados) eram pouco visados pelas políticas públicas e pela indústria do livro. O comum é que editoras criavam brinquedos que imitavam livros como os de pano, de borracha, de plástico e outros materiais resistentes ao tato, ao gosto, à água, À falta de traquejo das mãos infantis.
Em fins do século XX e início do XXI, a presença intensa de bebês nos berçários e escolas infantis desencadeou estudos com o intuito de prescrever quais seriam os livros que poderiam ser utilizados na alfabetização literária dessas crianças. Para Abramovich (1989), Coelho (1993) e Silva (1991), deveriam ser livros lidos por adultos para as crianças, ilustrados, bem humorados, poéticos. E deveriam conter histórias sobre bichos, brinquedos, objetos, seres da natureza, histórias de repetição e acumulativas. Obras com predomínio da fantasia como contos de fadas, mitos, lendas e fábulas e atitudes como o desenvolvimento da apreciação critica da leitura são recomendados. Pouco texto, muita gravura, cor e, em alguns casos, sons também foram sugeridos e apareceram no mercado. Livros de panos, livros-brinquedos e somente de imagens aparecem com frequência nos catálogos de Editoras.
Alfabetização Literária
No processo de apresentação do mundo da leitura literária ao bebê, penso que a criança pequena não pode ser subestimada.
A leitura de livros pode ter início assim que ela ficar ereta, sentada no colo do adulto, na cadeirinha ou no “bebê-conforto”. Para tal, o leitor (mãe, irmão mais velho, professora, cuidadora) deve escolher um excelente texto que pode ou não ser ilustrado. Defendo que, durante a leitura do texto escolhido, o som da voz e os ritos da leitura (escolher, abrir folhear, indicar imagens, fechar, guardar) são formadores desse leitor em potencial, tornando a leitura “de verdade” e não apenas imitação ou distração.
E lembre: um livro não é um brinquedo: é o artefato mais importante da cultura escrita e a leitura, seus atributos e sentidos podem ser adquiridos desde tenra idade.

Para Debus (2015), “a criança se constitui leitor bem antes de dominar o código escrito” e, nesse processo “a interação com o professor e as outras crianças do ambiente educacional é fundamental”. Assim, afirma a pesquisadora, “a constituição do acervo da educação Infantil não deve se restringir somente a livros-objetos, livros só de imagens ou livros com poucos textos; além desses, é salutar que existam narrativas encantatórias, poemas e textos mais longos, que muitas vezes não serão manuseados pelas crianças, mas farão parte do seu repertório por intermédio do professor”.