quarta-feira, 6 de março de 2024

Passos, de Alessandra Steilman

   


Passos

Alessandra Steilman

 

Primeiro eu esperei no mesmo lugar, onde você sempre soube que me encontraria, depois dei passos para trás, foi necessário me afastar. Mas não porque perdi o interesse, o sentimento, ou por não sentir falta, mas sim porque era doloroso demais ver você de longe não se interessando, não se esforçando e o pior, provavelmente não sentindo. Não era pra ser. Dizem. Mas o problema é que eu me doei, senti e me empenhei para que fosse. Eu tive fé que seria, e não será mais. Nunca mais. E dói.

Inclusive, o sentimento ainda existe e não importa o quanto eu possa ter sofrido em vão ou me magoado porque quando você ama e é leal à alguém você o ama com todas as feridas, incêndios, traumas e defeitos. Sempre se vê além. Em um amor real você assume o risco, e continua até onde for possível aguentar. O amor é real, mas exige empatia e coragem.

Eu queria que não fosse assim para seguir, queria que existisse um botão de liga e desliga, facilitaria a minha cura e amenizaria a saudade que salta do nada no meio do meu dia. Malditos gostos parecidos, malditas manias que peguei de ti e maldita vontade de te ter por perto.

Há dias em que acho que a superação está há poucos passos do fim, em outros dou três passos pra trás e eu não sei até quando isso vai, eu não sei quanto vai durar.

Estou tentando fazer o que acredito ser o certo, mas meu coração nem sempre concorda e eu vivo em constante conflito comigo mesma, pois apesar das minhas dores quero que saiba que eu não tenho remorso, que eu não quero que você sofra, que eu continuo aqui para quando estiver difícil suportar o peso do mundo ou quando sua mente estiver te fazendo acreditar que você é um vilão de novela mexicana (você não é) e eu não quero mesmo que se esqueça do tempo em que fomos nós. Quero que lembre com carinho, assim como eu. Essa é a direção dos meus passos, e eu espero (quase sonhando) que dos teus também.

VOA

Eu olho para a tela do celular esperando que chegue uma mensagem de um número estranho. Apaguei teu contato, então na verdade espero uma mensagem sua. Mas não qualquer mensagem... uma daquelas dizendo que ainda tem na memória as coisas que você costumava elogiar em mim, que lembra das nossas conversas profundas, que sente falta das minhas palavras, mas mais ainda da minha presença ao teu lado. As mensagens não vão chegar, estou certa que essa não é uma daquelas histórias que terminam com um "felizes para sempre". Não há como negar que tivemos tempo para tentar. Não existe dúvida, era o limite, o fim. Eu não sei mais se isso é bom ou ruim, ter insistido tanto só fez aumentar a saudade e as frustrações. Tanto esforço para quê? Para se sentir um trapo que precisa deixar ir todas as expectativas que você alimentou em mim? Como eu faço isso? Eu tento me distrair, mas além das lembranças, você também deixou o medo de me envolver de novo. Porque contigo foi assim sem querer, em um piscar de olhos o sentimento já tinha tomado conta. Me sinto perdida. Marco compromissos que tenho medo de ir. Eu sempre fui coragem. Algo aqui dentro está fora do lugar. Não me reconheço. Preciso entender o que está acontecendo. Preciso me curar, mas nem sei bem o que quebrou. Só sei que estou em cacos. A minha última esperança é conseguir fazer um mosaico bonito e colorido, que me faça acreditar novamente, me lembre quem eu sou. E que fique lindo quando eu recuperar a luz que foi se apagando com a tua indiferença.

 

A COR DA DOR E O MAR (OU CONTINUA)

Vestiu-se da cor

De sua dor

E a noite bonita

Pedia passos na areia

Queria que a dor

Não fizesse lembrar

Queria que a dor

Não tivesse cor

Vestiu-se também

Do tempo que a dor existe

Em seu vestido longo e preto

Quis sentir o mar

A noite, por coincidência

Pintou o mar da mesma cor

Que a cor da dor que sentia

A areia molhada, a onda sussurra

Mais perto, mais perto

A onda vem fria nas pernas

Mas não é incomodo

É o consolo da praia

Aos poucos a dor se funde

Com a cor escura do mar

E não é mais apenas a cor

Que une o mar e a mulher

São os mistérios que escondem

Os monstros que abrigam

E a imensidão de ser

Que os faz ter tanta vida

A onda vem fria nas pernas

Mas volta levando areia e a dor

Uma, duas, três vezes... Tudo se foi

Consolada, se despede da praia

Ela se esforça buscando palavras

O verso de seu poema preferido

Emerge em sua mente:

"Mas o coração continua"

A cor não carrega mais dor.

E a mulher, mais uma entre tantas vezes

Continua.

Nenhum comentário:

Postar um comentário